A União Europeia publicou em 09/06/2023 o
regulamento para proibir a entrada de itens agropecuários, como café, soja e
carne bovina, produzidos em áreas desmatadas mesmo que de forma legal conforme
legislação do país após 2020. As regras entrarão em vigor no dia 30 de dezembro
de 2024.
A medida é duramente criticada pelo setor produtivo
brasileiro. A avaliação é que a normativa europeia extrapola a lei nacional,
que prevê a possibilidade de abertura de novas áreas desde que respeitados os
limites de acordo com o bioma em que a propriedade está localizada.
A norma também prevê que as empresas importadoras deverão
apresentar documentos “verificáveis” para comprovar que os produtos cumprem os
critérios antidesmatamento. As regras serão aplicadas inicialmente para
bovinos, cacau, café, óleo de palma, borracha, soja e madeira, mas podem
abranger mais cadeias no futuro, como o milho. O prazo de implementação pelos
importadores europeus é de 18 meses.
O texto da lei já era conhecido pelos brasileiros, mas agora
foi definido o cronograma para vigência. “Essas regras não respeitam a
legislação local, o Código Florestal Brasileiro, além de ter um caráter
punitivo, excludente e não colaborativo”, disse à Globo Rural a diretora de
Relações Internacionais da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil
(CNA), Sueme Mori.
A preocupação é com o possível aumento dos custos de
produção no campo, principalmente para pequenos e médios produtores, para
comprovação do cumprimento das regras. “Não temos preocupação quanto a cumprir
os requisitos, mas sim com o custo para comprovar isso”, disse Mori.
Cada lote de produto que entrar na UE deverá estar
acompanhado de declaração contendo a relação de todos os produtores e
respectivas coordenadas geográficas das áreas de produção. “A norma introduz
uma série de novas exigências aos produtores e operadores, o que dificulta o
acesso ao mercado europeu, sobretudo para pequenos e médios produtores, ao
gerar custos adicionais e exigir uma reorganização da cadeia de produção”,
disse uma fonte da Missão do Brasil junto à União Europeia e à adidância
agrícola do Ministério da Agricultura.
Para essa fonte, a legislação preocupa pelo “caráter
unilateral, pela utilização de restrições comerciais para atingir objetivos
ambientais e também por seus aspectos punitivos e discriminatórios”. A crítica
mira a falta de mecanismos de apoio aos países produtores nos esforços de
combate ao desmatamento, recuperação de áreas degradadas e promoção da
sustentabilidade das cadeias de produção.
O alerta também está ligado à possível classificação do
Brasil como país de “alto risco”, por conta da taxa de desmatamento, o ritmo de
expansão de áreas agrícolas e a tendência de produção das commodities
contempladas, e o potencial de desvio de comércio decorrente disso. “Se o ônus
de comprovar a origem desses produtos está na mão do importador europeu, ele pode
deixar de comprar do Brasil e ir buscar em lugares com risco baixo, vai fugir
do risco”, explicou a diretora da CNA.
Até entrar em vigor, todos os países terão a mesma
classificação. “O governo e setor privado brasileiro têm que trabalhar junto
para que o Brasil não seja classificado como de alto risco, pois os requisitos
para exportação ficam ainda mais pesados. O impacto para o setor como um todo
vai ser muito grande”, afirmou Mori.
A UE classificará os países em três categorias de risco
(alto, padrão, baixo) pelo sistema de “benchmarking” e vai impor regras
distintas de diligência devida ou de controle aduaneiro aos produtos dos países
de cada categoria. “Essa diferenciação poderá gerar custos reputacionais e
desvios de comércio”, disse a fonte próxima dos diplomatas brasileiros no bloco
europeu. “O Brasil e vários outros países em desenvolvimento sempre se opuseram
à criação desse sistema, pelo seu caráter unilateral, potencialmente
discriminatório e seus possíveis impactos comerciais”, completou.
Mais barreiras
Sueme Mori pontuou que a publicação do regulamento europeu
pode abrir espaço para que medidas semelhantes sejam adotadas em outros países.
Reino Unido e Estados Unidos, terceiro maior cliente do agronegócio brasileiro,
têm legislações parecidas no forno.
Apesar de questionar a legitimidade da lei europeia, a
diretora da CNA diz que o caminho agora deve ser a negociação com o bloco, já
que o órgão de apelação da Organização Mundial do Comércio (OMC) está
inoperante. “Temos que negociar, ir por outras vias em busca de propostas de
comprovação dos requisitos socioambientais estabelecidos de forma que os
impactos e os custos aos produtores brasileiros sejam os menores possíveis”,
completou.
A diplomacia brasileira na Europa já expressou sua preocupação
quanto à compatibilidade do regulamento com as regras da OMC. A posição mais
clara foi divulgada recentemente, na revisão da política comercial da UE. O
governo examina outras alternativas de ação, disse a fonte que acompanha o tema
em Bruxelas, na Bélgica. “Continuaremos a questionar a legislação, mas, com sua
entrada em vigor, os países produtores e os seus setores privados precisam se
preparar”, apontou.
“É preciso estar atento às discussões sobre a implementação
da norma e trabalhar junto à UE por uma aplicação razoável e flexível, no
sentido de evitar rupturas ao comércio e mitigar os custos aos produtores. Da
mesma maneira, deve-se aproveitar as ferramentas de que os países já dispõem e
que apresentam resultados positivos em matéria de sustentabilidade”, concluiu a
fonte.
Peso comercial
A União Europeia é o segundo principal destino das
exportações do agronegócio brasileiro. Os negócios em 2022 renderam US$ 25,5
bilhões. Cerca de US$ 15 bilhões ou 60% dos embarques foram de produtos
contemplados pelo regulamento. A legislação também será aplicada a produtos
exportados para outros países e utilizados como insumos para produtos finais
que entram no bloco.
Alguns produtos têm peso maior. Quase metade do café
exportado pelo Brasil vai para o bloco. Em 2022, esses negócios renderam US$
4,4 bilhões, com mais de um milhão de toneladas.
No caso da soja, 14,5% dos embarques vão para portos da
União Europeia, mas isso representa quase 50% da oleaginosa que os europeus
compram de todo o mundo. No ano passado, essas exportações tiveram faturamento
de US$ 8,8 bilhões. Para a carne bovina, o diferencial é o prêmio pago pelo
bloco, que agrega valor à proteína brasileira vendida para lá. A madeira também
tem mercado cativo na Europa. Foram US$ 3,2 bilhões em negócios em 2022.
Fonte: BeefPoint
Acompanhe a Niceplanet nas redes sociais, a única assessoria que garante rastreabilidade com 100% de conformidade socioambiental.